Pensando mapas e conceitos

Neocolonialismo: um conceito atual?

Nas salas de aula, livros didáticos e até mesmo no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), os estudos a respeito da colonização e partilha da África e Ásia pelos países Europeus e os Estados Unidos no século XIX é chamado de Neocolonialismo. O tema é mostrado como um exemplo do imperialismo europeu, que nasce com a Revolução Industrial, a unificação de certos países como Alemanha e Itália e as disputas armamentistas na Europa. Além disso, o Neocolonialismo é trazido como uma das grandes causas da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o qual inflamou as guerras que já existiam entre os europeus.

No entanto, para entendermos se este conceito realmente se aplica ao tema do nosso site, vamos pensar na etimologia da palavra. Neo deriva do latim e significa Novo. Colonialismo, como é visto em outros assuntos escolares, é um termo amplo e terá um significado diferente para cada processo histórico e social específico. Contudo, em linhas gerais, pode-se dizer que é uma dominação política, econômica e/ou cultural de um povo contra outro povo. “Enriquece a classe dominante do povo explorador do outro. Há uma cumplicidade na nação dominadora, contra a nação dominada” (BARBOSA, 2011).

Nesse sentido, se há um “novo colonialismo”, por lógica, houve um “velho colonialismo” anteriormente, certo?

Sabemos que durante os séculos XVI e XVIII, houve presença européia na África, especialmente de Portugal e Espanha, países que comercializavam matéria-prima e pessoas escravizadas com reinos africanos. Sabemos também que, durante esse mesmo período, estes países dominaram terras americanas como o Brasil. Contudo, podemos afirmar que todos esses processos foram colonizações?

Em certos casos, países europeus dominaram política ou economicamente os reinos africanos. Entretanto, não podemos generalizar. A maioria dos povos africanos nos séculos XVI a XVIII tinha sua autonomia política e tratavam povos europeus como amigos ou adversários comerciais, disputando ou compartilhando territórios e espaços comerciais. Portanto, afirmar que antes havia um “velho colonialismo” é colocar os reinos africanos em “caixinhas” e inferir, de maneira errônea, que todos eles foram subjugados totalmente e da mesma forma.

Por conseguinte, se não houver um “velho colonialismo”, como poderia haver um “novo colonialismo”? Ademais, comparar processos de dominação econômica na Idade Moderna e a colonização institucionalizada da Idade Contemporânea é no mínimo injusto. Durante o século XIX, a dominação não foi apenas econômica ou política. Países europeus tentaram sistematicamente violentar e matar povos africanos, obrigando-os também a renegarem sua religião, costumes e cultura.

Nas universidades, muitos acadêmicos argumentam que o termo Neocolonialismo é mais apropriado para colonizações que ocorrem após a Independência dos países africanos durante o século XX. Baseando-se nessas discussões, propomos como tema do nosso site “Colonialismos nas Áfricas”.

Referência:

BARBOSA, Wilson do Nascimento. Neocolonialismo: um conceito atual?. Sankofa (São Paulo), v. 4, n. 8, p. 7-11, dez. 2011.

 

Mapas cristalizados geram uma África cristalizada?

Mapa comparado da África em 1880 e 1913
Mapa comparado da África em 1880 e 1913. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Scramble-for-Africa-1880-1913.png. Acesso em: nov. 2019.

 

No lado esquerdo, vemos o continente africano em 1880, antes da Conferência de Berlim, que ocorreu entre 15 de novembro de 1884 a 26 de fevereiro de 1885, e que como consequência obteve a partilha da África. Observa-se que os dois mapas são muito contrastantes, e não foi considerado os contextos locais já existentes - sendo traçado de forma muito descuidada. Como consequência, diversos conflitos ainda se dão na contemporaneidade por essa razão.

Já no lado direito, vemos o continente africano em 1913, depois da Conferência de Berlim. Em 1914, com exceção da Etiópia, da Libéria e da União Sul Africana, que eram independentes, e da Líbia e de Marrocos que não tinham sido ainda formalmente conquistados, o resto do continente encontrava-se já ocupado e dividido entre a Bélgica, França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Portugal, Espanha.

 

Mapa Cristalizado
Mapa Cristalizado. Disponível em: http://pessoal.educacional.com.br/up/4660001/10368895/t191.asp. Acesso em: nov. 2019.

 

É importante salientar que o uso de mapas no ensino é fundamental, ajudam os alunos a se localizar geograficamente, perceber mais facilmente as divisões, entre outros tantos tópicos. Porém, nem todos os mapas são bem feitos e, muitos apresentam erros básicos, logo, é necessário fazer críticas e mostrar isso ao aluno. Muitas vezes quando o assunto é colonização da África, os primeiros mapas mostrados são o antes e depois da Conferência de Berlim. O depois apresenta as divisões, os países europeus e seus domínios; e o anterior mostra diversas divisões étnicas, exemplificando a diversidade africana. Em um primeiro olhar, pode parecer muito positivo, contudo, esse mesmo mapa que tenta mostrar um continente diverso, no qual, os países portugueses não consideraram os contextos locais, contribui para uma cristalização do continente africano, já que não tem data, nem legendas. Os alunos podem então interpretar equivocadamente que antes do século XIX, a África sempre teve aquela divisão, como se não houvessem migrações, conflitos e junções, contribuindo, assim, para um imaginário de que a África é um continente sem processos históricos.