As Oleiras Santiago Norte

Vinícius Venancio de Sousa 

Doutorando em Antropologia Social – PPGAS/UnB

A olaria é uma atividade tradicional em Cabo Verde, especialmente nas ilhas de  perfil mais agrário. Em Santiago, a mais populosa das dez ilhas que compõem o país arquipélago e onde está localizada a capital do país, Praia, não é diferente. É no seu  interior que a produção da cerâmica floresce com afinco.

A cerâmica assume um lugar central na vida santiaguense desde o período  colonial, uma vez que os fogões, bindes (cuscuzeiras), panelas e moringas eram todas  feitas de cerâmica. Essa tradição segue até os dias de hoje, quando a cerâmica passa a ser  vendida também como souvenir, com o advento do turismo no arquipélago. 

Em um contexto de escassez de trabalho formal e forte tendência à emigração,  mulheres-mães se dedicam à produção da cerâmica, começando da apanha do barro,  passando pela sova, moldagem e cozimento das peças, indo até sua venda nas grandes  feiras da ilha.  

A partir desse cenário, o presente ensaio fotoetnográfico nos aproxima do  cotidiano das mulheres de duas olarias: a “Arte e Cerâmica”, em Fonte Lima, e “Ponto de  Encontro”, em Trás-os-Montes – ambas na parte norte da ilha de Santiago. A composição  imagética busca acentuar a centralidade da cerâmica na vida dessas mulheres. Em  especial, demonstrando como, ao moldarem a cerâmica, elas também têm suas vidas  moldadas. O ensaio é fruto do trabalho de campo realizado na supracitada ilha entre  fevereiro e junho de 2019, no âmbito da pesquisa acerca da construção da identidade  nacional cabo-verdiana a partir da produção de souvenires.

Em cima de um torno – base giratória usada na produção da cerâmica – há uma escultura feita desse material que representa uma mulher negra apoiada em suas pernas. Os braços estão quebrados em diferentes alturas devido a ação do tempo.

Legenda: Se do barro o homem teria vindo, também dele se faz a mulher, que apanha a terra, pila o barro e molda-o a seu dispor, podendo manuseá-lo à sua imagem e semelhança, de forma quase divina.

Descrição: Em cima de um torno – base giratória usada na produção da cerâmica – há uma escultura feita desse material que representa uma mulher negra apoiada em suas pernas. Os braços estão quebrados em diferentes alturas devido a ação do tempo.

 

Em destaque, duas mãos moldam o barro em um molde de gesso com o apoio de uma pequena espátula. Esse molde é utilizado para fazer peças côncavas.

Legenda: Assim como o molde ajuda a dar forma à cerâmica, o trabalho na olaria possibilita que as mulheres delineiem outros caminhos para suas vidas e de seus familiares.

Descrição: Em destaque, duas mãos moldam o barro em um molde de gesso com o apoio de uma pequena espátula. Esse molde é utilizado para fazer peças côncavas.

 

 Nesta foto, a mulher mais jovem que está ao fundo da foto anterior é apresentada em destaque. Sua concentração é grande. Assim como as demais, usa um pano na cabeça.Legenda:Na olaria, as mulheres riem, comem, contam causos e produzem suas peças em conjunto. Juntas, elas se apoiam no enfrentamento das adversidades do cotidiano e tornam os problemas mais leves.

Descrição: À frente, uma mulher em roupas com tons quentes faz a raspagem de um jarro alto com a base arredondada. À esquerda e ao fundo, outra mulher mais jovem molda com as mãos uma esfera.

 

Nesta foto, a mulher mais jovem que está ao fundo da foto anterior é apresentada em destaque. Sua concentração é grande. Assim como as demais, usa um pano na cabeça.

Legenda:Após ter seus projetos de vida modificados com o nascimento de sua filha, Danilda encontrou na olaria o acolhimento necessário para traçar caminhos outros.

Descrição: Nesta foto, a mulher mais jovem que está ao fundo da foto anterior é apresentada em destaque. Sua concentração é grande. Assim como as demais, usa um pano na cabeça.

 

Na porta, mas na parte interna da olaria, uma senhora de cerca de 50 anos faz a raspassem de uma peça que se tornará um binde (cuscuzeira). Ao fundo e ao pé de uma árvore está sua mãe.

Legenda: Mãe e filha se encontram na cerâmica e fazem dela a garantia de reprodução material de sua família. Dona Toca, ao fundo, é uma das grandes mestras da olaria em Fonte Lima e ensinou tudo que ela sabe para dezenas de mulheres da região, incluindo sua filha, Laurinha, à frente.

Descrição: Na porta, mas na parte interna da olaria, uma senhora de cerca de 50 anos faz a raspassem de uma peça que se tornará um binde (cuscuzeira). Ao fundo e ao pé de uma árvore está sua mãe.

 

Na frente, temos uma mulher moldando um binde com uma espátula. Usando avental e lenço no cabelo para se proteger dos resquícios de barro, ela está cercada de peças semelhantes a que ela faz, assim como de instrumentos outros usados na raspagem e modelagem das peças.

Legenda:Dada a dificuldade no acesso aos bens de consumo, os bindes, produzidos pelas oleiras, são usados no cotidiano por elas e outras mulheres para cozinhar o cuscuz, cujo milho também é cultivado por elas e seus familiares.

Descrição: Na frente, temos uma mulher moldando um binde com uma espátula. Usando avental e lenço no cabelo para se proteger dos resquícios de barro, ela está cercada de peças semelhantes a que ela faz, assim como de instrumentos outros usados na raspagem e modelagem das peças.

 

A mesma mulher da foto anterior aparece aqui com outra roupa, mas mantendo o lenço no cabelo e o avental. O objeto a ser moldado nessa imagem é uma moringa, cujos detalhes são cuidadosamente traçados com um estilete. Ela está curvada e com olhar fixo à moringa.

Legenda: Enquanto a época da chuva não chega, período em que as oleiras deixam a cerâmica de lado e se dedicam à agricultura, a terra provê a subsistência dessas mulheres e seus familiares na forma do barro.

Descrição: A mesma mulher da foto anterior aparece aqui com outra roupa, mas mantendo o lenço no cabelo e o avental. O objeto a ser moldado nessa imagem é uma moringa, cujos detalhes são cuidadosamente traçados com um estilete. Ela está curvada e com olhar fixo à moringa.

 

Por último, temos duas mulheres na porta da olaria, mas apenas uma dela aparece mais. Esta olha fixamente para a câmera e em seu rosto a espera é marcada. Ela veste uma camisa de manga longa vermelha, saia quadriculada, avental e lenço no cabelo.

Legenda: A espera é elemento constitutivo da vida dessas mulheres. Seja pelos parentes emigrados, ou pelas cerâmicas, que precisam secar e queimar para ficarem prontas. Enquanto esperam, as oleiras vislumbram, pela porta das olarias, o que há de vir.

Descrição: Por último, temos duas mulheres na porta da olaria, mas apenas uma dela aparece mais. Esta olha fixamente para a câmera e em seu rosto a espera é marcada. Ela veste uma camisa de manga longa vermelha, saia quadriculada, avental e lenço no cabelo.